Sonetos
de Persistência
por
Felipe Amaral
1
Ventos
ávidos, ventos de além-mar
Que
infestais minha vida de ilusão!
A
liteira onde vai, em procissão,
Rei
dos sonhos que deixo de sonhar.
Far-se-ia
melhor este ofegar,
Que
é constante pungir de coração
Que
persiste a bater, na intenção
De,
rebelde, insistir em me enganar?
Far-se-ia
melhor esta existência?...
É
o golpe mortal da persistência
Que
me põe à mercê deste sepulcro.
Sem
esteio, caminho a rir doidices,
A
falar coisas loucas, chocarrices...
Corpo
frio sem escora; alma sem fulcro.
2
Vejo
ao longe ideal realidade,
Mas,
por mais que caminhe, não alcanço.
Não
há riso na vida; e, sem descanso,
Não
há vida na vida, na verdade.
Barco
solto, sem velas, na vontade
De
querer ganhar mares sem avanço.
O
insistir em cair no solo manso
Do
marasmo que mata a liberdade.
É
a doce e onírica quimera
Que
se esvai no silêncio da cratera,
No
arquejar do sepulto corpo inglório.
O
notório porvir sem ar notável;
O
correr sem chegar; o inexorável
Prantear
de um viver vão merencório.
3
O
ilusório sonhar dos esquecidos
Talvez
seja o motivo do ostracismo
Que
os eleva ao altar do fundo abismo
De
ilusões, a torná-los mais perdidos.
O
ilusório viver desses caídos
Na
valeta, sarjeta, num batismo
De
desgraças que matam o lirismo
Que
bem fora-lhes graça, em tempos idos.
Mas
não há mais aplausos nem sorrisos.
Nem
o palco mais doa os áureos pisos
Aos
seus pés já cansados de seguir.
Não
há nada nas ruas para o louco.
Não
há nada... Não há... Nem há tão pouco
Piedade
em seu mísero porvir.
4
É
um pobre mendigo que manqueja
Pelas
ruas, pedindo o pão diário.
É
retrato de um homem que o fadário
Transformou
numa coisa que rasteja.
É
o pó sem o dó que o ser deseja.
É
um só como um Jó que um emissário
Estarrece
co'as novas, em horário
De
banquete que as mesmas não enseja.
Só
que tudo se faz desnorteante...
Só
que agora o prazer deixa o instante
Para
que algo tão fúnebre se avulte.
O
desejo decai, o ser suspira.
Toda
a força se esvai e, assim, expira
Um
varão pra que a mão do mal sepulte.
5
Antes
risos sem fim, mil maravilhas,
Mas
agora um tufão de vendavais.
Resta
ao ser relembrar uma vez mais
Os
momentos de paz em suas trilhas.
Perde
o sonho. Da vida, perde as filhas.
Os
rebentos dos sonhos figadais.
Não
há quem se apiede dos umbrais
Do
seu lar de ilusões: imersas ilhas!
Pede
a Deus para ver de novo gozo.
Suplicante,
humilhado, ao Poderoso
Ele
implora o socorro divinal...
Ninguém
sabe explicar sua desdita.
Não
há sábios por perto e a bendita
Esperança
perece no final.
6
Deus
que aos pobres ouvis, ouvi, suplico-vos,
Meu
clamor de tristeza e desalento.
Recriai
novo espírito, um rebento,
Nesta
alma... Eis que a fé – por fé – dedico-vos.
Deus
que o mundo criais, fazei. Aplico-vos
Minha
fé – pobre fé! - neste momento.
Operai,
ó Eterno, em advento
De
Alegria, o socorro que adjudico-vos.
Pai
das almas, tornai a dar a vida
A
um, vosso lacaio, que a ferida
Da
cruel provação fez claudicante.
Pai
do cosmos, salvai este leproso!
E
que a paz torne a dar à vida gozo
Pra
que o corpo jubile e a alma cante.
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