segunda-feira, 14 de março de 2016

Minhas Crônicas - Olhando para um lápis


Minhas Crônicas

Olhando para um lápis
por Felipe Amaral

Um mísero pedaço de madeira e grafita tem mais a ver com o que sente meu âmago do que do que mil poemas escritos com o mesmo. A grafita conta das marcas feitas a ferro e fogo no coração cansado de poeta. A qualidade da madeira, da minha insipidez de escritor insistente. Mas o mar pode levar-me a pensar respostas para as perguntas que vem-me à mente ao olhar para um lápis apontado pelo desejo de escrever em infindo fluxo. As linhas que traçam lápis bem apontados são traços que levam os homens a caminhos de glória nos jornais. Ou, em ditaduras, a caminhos de cadeias lotadas de presos políticos. Falar de pena é falar da vida. A pena é uma vida que percorre o papel. Cada desenho, uma expressão do que sonha a mente; cada palavra escrita, um oásis de satisfação ao poeta por ofício. A redação feita a lápis conta dos enredos da vida a um, a dois, em grupo num sobrado em tempos de faculdade distante. Apartamento apertado. No escuro da grafita vejo o escuro de dias de noite emocional. Tristezas e problemas a resolver. Choros a findar. É o escuro. O mesmo que permite a confecção dessas frases. O mesmo que registra sentenças: literárias e judiciais. Um ai para os ânimos exaltados. E, vendo a circularidade do mesmo lápis, sou reportado à circunferência do infinito que tento perscrutar quando escrevo sobre uma perspectiva “minimalista-fluxista”. Mas não que isso queira pensar nem em querer dizer-me alguma coisa. Quer e não quer. Sendo e não sendo. Mas não escapando do fato de que “ser e não ser” é uma espécie de “ser”. É vendo um simples lápis que vislumbro o paradoxal. Mas que teria de paralelo um lápis e um dizer-refletir “oximórico”? - pergunta você. Respondo: - Tudo! Um lápis serve ao paradoxo como a alma ao corpo. Dá-lhe combustível para queimar. É seu combustível. Lápis que traça círculos. Círculos que lembram eternidade. Eternidade que remete ao Céu. Céu que suprime o profano. Profano que toma o lápis por instrumento de expressão. Um objeto reles. Abjeto. Achava cotocos jogados no chão da escola. No chão contrário ao Santo Céu. Na escola contrária à vivência das ruas. Cotocos de coisas que parecem mais cotocos de vida. Limitada coisa. Um cotoco. Pedaço que lembra o quão breve é a existência. Mas como pode um mesmo objeto falar de coisas tão opostas? - inquire você. Tudo pode. Como diz o lugar-comum: “está nos olhos de quem vê”. Coloco à mesa um lápis e o chamo de tristeza. Não é ele mais lápis é tristeza. E não é tristeza ao mesmo tempo. É lápis que representa coisa nenhuma. E representa ao mesmo tempo. É coisa e não-coisa. É tudo. Pode falar-me de juventude, quando nas mãos de ávido escritor púbere e impressionado com sua recém oportunidade conseguida de escrever na gazeta mais revolucionária de toda “editoração” universitária. Fala-me de rosas, quando penso de que floresta procede sua madeira. Fale-me de escolas de época. Escolas que “abrigaram” mentes brilhantes enjauladas em movimentos, sonetos e romances que só queriam focar uma coisa só. Mas eu não. Meu “fluxismo” leva-me a olhar para um pedaço de papel rabiscado por um lápis chulo como se olharia para a mina mais recheada de pedras preciosas. Esse papel não é o que se vê. Os rabiscos também não são. Papel é pureza expressa em brancura de laudas. Rabisco é marca na areia da praia. Praia que lembram para onde nos leva o mar. Mar que lembra para onde nos levam os sonhos. Sonhos que motivaram navegantes. Eu paro por aqui por ser já hora de dormir, mas, se quisesse, poderia passar horas e horas aqui. Acho – enfim – que descobri a fórmula para um fluxo contínuo de ideias divagantes, embora muito bem supervisionadas. Acho que nem eu ousaria escrever tanto assim. Mesmo o querendo...

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