Minhas
Crônicas
Olhando
para um lápis
por
Felipe Amaral
Um
mísero pedaço de madeira e grafita tem mais a ver com o que sente
meu âmago do que do que mil poemas escritos com o mesmo. A grafita
conta das marcas feitas a ferro e fogo no coração cansado de poeta.
A qualidade da madeira, da minha insipidez de escritor insistente.
Mas o mar pode levar-me a pensar respostas para as perguntas que
vem-me à mente ao olhar para um lápis apontado pelo desejo de
escrever em infindo fluxo. As linhas que traçam lápis bem apontados
são traços que levam os homens a caminhos de glória nos jornais.
Ou, em ditaduras, a caminhos de cadeias lotadas de presos políticos.
Falar de pena é falar da vida. A pena é uma vida que percorre o
papel. Cada desenho, uma expressão do que sonha a mente; cada
palavra escrita, um oásis de satisfação ao poeta por ofício. A
redação feita a lápis conta dos enredos da vida a um, a dois, em
grupo num sobrado em tempos de faculdade distante. Apartamento
apertado. No escuro da grafita vejo o escuro de dias de noite
emocional. Tristezas e problemas a resolver. Choros a findar. É o
escuro. O mesmo que permite a confecção dessas frases. O mesmo que
registra sentenças: literárias e judiciais. Um ai para os ânimos
exaltados. E, vendo a circularidade do mesmo lápis, sou reportado à
circunferência do infinito que tento perscrutar quando escrevo sobre
uma perspectiva “minimalista-fluxista”. Mas não que isso queira
pensar nem em querer dizer-me alguma coisa. Quer e não quer. Sendo e
não sendo. Mas não escapando do fato de que “ser e não ser” é
uma espécie de “ser”. É vendo um simples lápis que vislumbro o
paradoxal. Mas que teria de paralelo um lápis e um dizer-refletir
“oximórico”? - pergunta você. Respondo: - Tudo! Um lápis serve
ao paradoxo como a alma ao corpo. Dá-lhe combustível para queimar.
É seu combustível. Lápis que traça círculos. Círculos que
lembram eternidade. Eternidade que remete ao Céu. Céu que suprime o
profano. Profano que toma o lápis por instrumento de expressão. Um
objeto reles. Abjeto. Achava cotocos jogados no chão da escola. No
chão contrário ao Santo Céu. Na escola contrária à vivência das
ruas. Cotocos de coisas que parecem mais cotocos de vida. Limitada
coisa. Um cotoco. Pedaço que lembra o quão breve é a existência.
Mas como pode um mesmo objeto falar de coisas tão opostas? - inquire
você. Tudo pode. Como diz o lugar-comum: “está nos olhos de quem
vê”. Coloco à mesa um lápis e o chamo de tristeza. Não é ele
mais lápis é tristeza. E não é tristeza ao mesmo tempo. É lápis
que representa coisa nenhuma. E representa ao mesmo tempo. É coisa e
não-coisa. É tudo. Pode falar-me de juventude, quando nas mãos de
ávido escritor púbere e impressionado com sua recém oportunidade
conseguida de escrever na gazeta mais revolucionária de toda
“editoração” universitária. Fala-me de rosas, quando penso de
que floresta procede sua madeira. Fale-me de escolas de época.
Escolas que “abrigaram” mentes brilhantes enjauladas em
movimentos, sonetos e romances que só queriam focar uma coisa só.
Mas eu não. Meu “fluxismo” leva-me a olhar para um pedaço de
papel rabiscado por um lápis chulo como se olharia para a mina mais
recheada de pedras preciosas. Esse papel não é o que se vê. Os
rabiscos também não são. Papel é pureza expressa em brancura de
laudas. Rabisco é marca na areia da praia. Praia que lembram para
onde nos leva o mar. Mar que lembra para onde nos levam os sonhos.
Sonhos que motivaram navegantes. Eu paro por aqui por ser já hora de
dormir, mas, se quisesse, poderia passar horas e horas aqui. Acho –
enfim – que descobri a fórmula para um fluxo contínuo de ideias
divagantes, embora muito bem supervisionadas. Acho que nem eu ousaria
escrever tanto assim. Mesmo o querendo...
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