segunda-feira, 11 de maio de 2015

Assombridades - Cordel de Malassombro - RF Amaral

Assombridades
(coloquial)
1
Andando na rua à noite,
Parei de frente uma casa.
Vi algo de olhar estranho,
Vermelho feito uma brasa.
Desejei entrar no troço,
Mas pensei "hoje não posso
Tenho que ir noutro canto".
Quando em caminho, senti
Algo assombroso e me vi
Todo envolvido em espanto.
2
Apressei então o passo,
Querendo chegar ligeiro...
Mas tinha como que alguém
Comigo o caminho inteiro.
Cheguei no canto visado,
Completamente assombrado,
Mas, depois, normalizou.
Pouco tempo ali fiquei.
Logo depois retornei
À estrada e o medo voltou.
3
Apesar de acompanhado,
Me encontrava apreensivo.
Tentava puxar assunto,
Mas não achava incentivo.
Um silêncio se instaurava
E, enquanto se caminhava,
O temor ia aumentando.
Ante o que, meu companheiro
Começou andar ligeiro
E despediu-se inda andando.
4
Eu notei algo de estranho
Nessa sua despedida,
Mas não quis perguntar nada
E prossegui em partida...
Passei pelo cemitério
E o troço ficou mais sério:
Até vozes já ouvia.
Já estava até correndo;
Senti como um toque horrendo,
Mas segui na correria.
5
Não ia parar pra nada.
Só olhava pro asfalto.
Nesse ponto eu já ouvia
Vozes conversando alto.
Queria chegar em casa,
Mas tudo demora e atrasa
Quando a gente mais precisa...
Já estava escurecendo,
O povo se recolhendo,
Ao sopro frio da brisa.
6
Tendo ou não tendo pessoas
Na rua, o caso era o mesmo.
Caminhava, caminhava,
Já quase seguindo a esmo...
Minha casa não chegava.
A hora já avançava.
Tudo era muito esquisito.
Me vi numa rua errada.
Tentei voltar pra estrada,
Mas o trecho era infinito.
7
Passou um cachorro preto
Por mim e parou à frente.
Gelei dos pés à cabeça
E estagnei mudamente.
O bicho virou um vulto
De algum defunto insepulto
E se esvoaçou no ar.
Alguém pegou no meu ombro.
Aí, eu vi malassombro
Que deu trabalho contar.
8
Como que uma alma lesmática
Se arrastava pelo chão.
Uma caveira malévola
Vinha em minha direção.
Um corvo malassombrado
Tinha um braço desmembrado
Que no bico carregava...
O espectro de um trem passando...
E um ser alado bradando,
Só que só eu escutava.
9
Passei uma ponte velha.
Margeei outra necrópole.
E, apesar de estar diante
De uma tão clara metrópole,
Parecia que o escuro
Me cercava e um obscuro
Feitiço me revestia...
Fato é que o que eu avistava,
Quem me via, não notava;
Quem me notava, não via.
10
Dessa mistura de coisas
Eu já não tinha esperança
De escapar tranqüilamente
Devido à brusca mudança
Do cenário e o seu aspecto,
Agora imerso no infecto
Lamaçal da catacumba.
Tudo dizia pra mim:
"Agora chegou seu fim.
Caia, agonize e sucumba!"
11
Sentia tontura e sono.
Perturbações cerebrais.
Havia um terrível monstro
Sobre os prédios colossais.
Via uma rasga-mortalha,
Um abutre e uma gralha
Agourando o ambiente.
A lua jorrava sangue
E uma criatura langue
Por sobre uma alma doente...
12
Um esqueleto dançante.
Uma pantera fantasma.
Um fogo-fátuo constante
Que deixava a alma pasma.
Tudo o que há de mais satânico,
Me causando enorme pânico,
Tormento e estremecimento.
Nada tornava ao normal
E uma neblina infernal
Pairava em dado momento.
13
Quando eu ia pela mesma
Sendo engolido, acordei,
Já dentro de minha casa.
Coisa co'a qual me assustei.
Mas agradeci a Deus
Por proteger-me ante o meus
Desvios e desvarios...
Estando bem, agradeça
Para que não lhe aconteça
Pegar os mesmos desvios.

Roberto Felipe Amaral

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