domingo, 24 de maio de 2015

Onze Sonetos - Por Roberto Felipe Melo Leite do Amaral

Onze Sonetos.
Por Roberto Felipe Melo Leite do Amaral
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Soneto 1
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Para as laudas e os versos fui chamado.
Deus me fez sonhador. Fez-me poeta.
A magia do sonho em mim projeta
Novo olhar sobre o todo que é mostrado.

Sou um barco erradio que, deixado
À deriva, perdeu-se, na irriquieta
Avidez de se achar em viva meta,
Que mostrou-se ilusória em dado estado.

Fiz-me o todo de tudo e tudo em todo
Pensamento em desvelo do denodo
De teimar em seguir loucuras tais.

Sou do ventre do povo o mais indócil,
Que renego tornar-me mais um fóssil
Nos penedos das classes sociais.

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Soneto 2
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Minha guerra é de ideias, de ideais.
Minha mente vagueia em busca vaga.
O meu ser não suporta a aziaga
Injunção que aprisiona os meus iguais.

Livre vivo, pois Deus, o Pai dos pais,
Fez-me assim e assim tudo em mim divaga
Procurando perder-se na pressaga
Condição que me enleva mais e mais.

Um funâmbulo sou, porém sem medo.
Meu caminho ridente e o meu segredo
É buscar o prazer santo e excelente.

Os demais são robôs. Povo infecundo.
São caniços no infecto lodo imundo
Que polui emoções e suja a mente.

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Soneto 3
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Ando em nuvens, mas vivo alegremente.
Não escuto palavras sem contexto.
Prescindindo de mote e de pretexto,
Sigo em paz minha vida divergente.

No horizonte eu avisto claramente
Poesia epopeica em vivo texto.
Multiplicam-se os pães dentro do cesto
Que, por fé, eu enxergo em minha frente.

Os meus dias se passam na ventura.
Não permito que o medo, que enclausura
Os demais no marasmo, chegue a mim.

Sinto a brisa. Da flor, sinto o aroma.
Ante o mar, o sagrado amor me toma;
E ante a luz do luar, a paz sem fim.

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Soneto 4
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Sou poeta. Sou louco. E, ai de mim,
Se disser que não sou. Que eu sou de fato
Como a folha levada, em fino trato,
Pela brisa suave no jardim.

Sou no chão andarilho. Sou assim,
Peregrino na terra. Sou o exato
Desapego de tudo. Sou o acato
Das ideias dos livres, isso sim!

Minha vida é um conto. Meu futuro
É de Deus. E é em Deus que eu me asseguro
Do futuro que de antes já me aguarda.

Sou do jeito das aves. Como os lírios
Que há nos campos. Renego os vis martírios
Pra sorver o prazer que a paz resguarda.

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Soneto 5
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Como a pluma diante da bombarda,
Eu coloco-me frente ao frenesi
Dos contrários que vêm até aqui
Desejando-me ver o fim que tarda...

Sou a flor pela mão, que se acovarda
Em livrar-me, amassada. E peço a ti
Que me salves do mal. Tires daqui
Desse mundo o rancor que o ser albarda.

Tudo pode ser simples, não há nada
Que nos venha obrigar a pôr em cada
Puro instante uma mácula de intriga.

Tudo pode ser feito mansamente.
Não há nada que obrigue nossa mente
A sofrer com a dor vil que fustiga.
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Soneto 6
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A pureza do instante é mar que irriga
Nossos sonhos mais leves e mais belos.
Deixa a mágoa. E derruba os vãos castelos
Da vingança, erigindo a paz amiga.

Vive livre e esquece o que castiga
A tua alma co'o que desfaz teus elos
De esperança e sossegos mais singelos
Operando em favor da mágoa antiga.

Faz da vida oceano de tranqüilas
Águas límpidas, vendo que as estrilas
Só nos levam ao ódio "insalutar".

Peregrina contido em temperança
A nutrir o fulgor da esperança,
Que é o que pode este mundo transformar.
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Soneto 7
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Vôo em busca da paz e, ao repousar
Sobre nuvens de alvura de algodões,
Tranquilizo o meu ser nas distrações
Que o momento me traz sem eu notar.

É no azul que há no céu que erijo um lar.
É nas ondas azuis das emoções
Que há nas ondas do mar que as fruições
Do prazer sempiterno eu posso achar.

Tudo belo e afável, branco e puro.
O sorriso contínuo em um futuro
De bonança vestal que satisfaz.

Um caminho de rosas. Lar em festa.
Alegria tal que se manifesta
Na virtude que o tempo não desfaz.
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Soneto 8
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Não desejo riquezas, mas assaz
Busco o ouro sublime da virtude.
Não me dês abastança de inquietude
Que advém da fortuna ineficaz.

Dá-me o doce do gozo que, aliás,
Mais que gozo se faz que em hebetude.
Não almejo o prazer vil da atitude
Secular que se farta de obras más.

Quero o puro descanso da candura.
Quero o ardor da felicidade pura.
Quero o alvor infinito. A eutimia. 

Só a sã imperturbabilidade
Do sagrado me guia de verdade
Ao repouso infindável da alegria.
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Soneto 9
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O sossego na vida propicia
Mansidão ao vivente e o faz mais ser.
Sem sossego não há nenhum prazer
Na'existência e a alma se esvazia.

Deus nos dá o prazer que renuncia
O buscar infindável do viver
Que o mundano vivente insiste em ver
Como a foz do sentido em sua via.

Esquecendo a inquietação revel,
Os humanos avançam na fiel
E áurea posse de essência e de sentido.

Todavia, ofertando-se ao cansaço,
Só se afundam na dor desse erro crasso
E não notam que o mundo está perdido.
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Soneto 10
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Tenho muito a dizer deste incontido
Mundo torto de engano e desavença.
Nele o ser submerge na descrença
E se perde na falta de sentido.

Não há paz neste mundo pervertido.
Não há honra. Não há cura, há doença.
Não há vida, somente a vil presença
Da horrendo desmando desmedido.

A procura é inútil. O ganho é zero.
Neste mundo viver mesmo eu não quero,
Então fujo das dores que ele gera.

Ocupando a minha alma com o acerto,
Desvencilho-me, em tudo, desse aperto
Que atormenta os demais e os encarcera.
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Soneto 11
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A barbaça do tempo vai singrando
Pelas águas do mar azul revolto.
Somos como a barcaça, e o ser envolto
De ilusões permanece navegando.

Mas não sabe que a vida está a mando
Do mundano poder que deixa solto
O terror do desmando mais indouto
Que perverte do todo o bom comando.

Volta, ser, ao repouso! Torna à paz!
Não há nada de bom na ineficaz
Enfadonha canseira deste mundo.

O insuspeito prazer está no santo
Impassível descanso e no acalanto
Do divino viver quieto e profundo.
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