terça-feira, 19 de maio de 2015

Sonetos em “Ais” - Por Felipe Amaral

Sonetos em “Ais”
Por Felipe Amaral
1
Sou da noite soturna um serviçal.
Peregrino entre valas sepulcrais,
Catacúmbicas covas em que o sal
Degenera os defuntos humanais.

Vou à rua à procura da caudal
De ilusões mortuárias e ferais
Que parecem tomar, em seu total,
As centrais avenidas colossais.

Sorvo o medo que o ar abantesmal
Traz à tona, no urbano ritual...
E os sorrisos desfazem-se ante o cais...

Gritos há que se escutem no local.
O terror manifesta-se letal.
E a moléstia viral ceifa os mortais.
2
Há um lobo na rua lateral
Que devora os mais belos ideais,
Ao trazer zombaria sem igual
Aos que, em vida, anteveem seus finais.

Ouço a voz de uma larva fantasmal
Que se roja no chão das catedrais.
Diz que o fim está próximo e que o mal
Já selou suas vis credenciais.

Não há nada a fazer. O temporal
Sobrevém. E a discórdia universal
Constitui-se já parte dos sinais.

Eis o quadro da morte! Eis o real
Panorama atual! Vede o infernal
Monstro capro em sorrisos triunfais!...
3
Lodo vil: a chacina figadal
Que se espalha nas chãs sacramentais.
Lamaçal de aparência sem igual.
Vala podre. Putrefações dos sais.

Ares de hálito sujo e feretral.
Cripta escura onde os restos corporais
Decompõem-se e exalam gás mortal
Em sutis fogos-fátuos viscerais.

Quando a noite retumba no portal
Da calada, o temor, como um punhal
Transpassante, perfura órgãos vitais.

Salivando, o terror concede o aval
Pra que o mal aziago e sepulcral
Sorva a vida das almas virginais.
4
O prodígio do medo em funeral
De sorrisos passados nos quintais
Da'alegria mais límpida e vestal
Vaticina hora sobrenatural.

Chega o tempo em que a morte pontual
Chega para sorver do ser as tais
Alegrias da vida e pôr final
Nos momentos que tem por seus rivais.

Tomba o corpo no báratro abismal.
Vermes sentem da carne o ar mortal.
Larvas comem do morto as carnes tais.

Tapurus, que se nutrem da letal
Hecatombe, na seiva intravenal,
Dessedentam desejos diabrais.


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