quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A Esquina Engolidora

E isso não é maravilha,
Porque o próprio
Satanás se transfigura
Em anjo de luz.
(II Coríntios 11.14)

Baseado em Boatos Reais



A Esquina Engolidora

1
Em tempos não tão distantes
Eu resolvi caminhar
A altas horas da noite
Só pra poder contemplar
O pleno céu estrelado
E a face astral do luar.
2
Meu horário “insalutar”
Começava à zero hora.
Punha uma roupa de frio,
Pois sabia que lá fora
Estaria “um gelo só”,
Visto que o ar colabora.
3
Ao me vestir sem demora,
Ouvia as conversações
Dos caras que me esperavam
De luvas e jaquetões
Pra gente ir dar um rolé
Por aqueles quarteirões.
4
Só das imediações
De onde eu morava saíam
Uns nove caras fanáticos
Pela noite e que faziam
De tudo pra’andar à noite
Que as noites os atraíam.
5
Fora esses caras que iam
Comigo todo o caminho,
Havia’outros que nos viam,
Ou um andando sozinho
Que à turma se agregava,
Seguindo sem desalinho.
6
Perfazia com carinho
Aquele caminho todo.
E ali, com tantos colegas,
Não me faltava denodo (^)
Pra caminhar na “madruga”
Sem temer qualquer engodo (^).
7
Poça, espinho, pedra e lodo,
Por tudo a gente passava...
Só que, de uns meses pra frente,
Sutilmente eu já notava
Que o grupo se resumia,
Mas o porquê não achava.
8
Uns quinze a gente contava
Que faziam tal percurso,
Porém se foi reduzindo
Sem um motivo ou discurso
Que esclarecesse o desfalque
Da nossa aventura “em curso”.
9
Onça, leão, lobo ou urso,
Nada podia parar
A nossa turma animada,
Então “comecei buscar”
Explicações para as faltas
Que eu já estava a contar.
10
Comecei a perguntar
Nas casas dos tais colegas,
Nos seus locais de trabalho,
Mercados, bares, bodegas
Onde costumavam ir,
Mesmo assim findei às cegas.
11
“Sem buscas e sem entregas”
As conversas se perderam
No vento, e os moradores
Nem sequer se surpreenderam
“Com’o desaparecimento
Dos que desapareceram”.
12
Muitos mais se escafederam
E eu fiquei andando só,
Porém bem mais apressado
Afinando o mocotó
Por ruas e avenidas,
Enfrentando até toró.
13
Co’a gola “pelo gogó”
Eu andava na “madruga”
Certo dia, quando eu vi
Um lençol sem dobra ou ruga
Voando ali numa esquina
E, ao me assustar, eu “dei fuga”.
14
Parei de andar na “madruga”
Daquele dia pra frente
Depois de ficar sabendo
Em conversa de batente
Que a esquina era chamada
De “Engolidora de Gente”.
15
Então rebusquei na mente
Algo que não se imagina,
Lembrei que os colegas todos
Que dobraram tal esquina
Pra’ali poderem’urinar
Padeceram’a mesma sina.
16
Só que, em meio a tal rotina
De nossa árdua caminhada
(Que, mesmo árdua, era “legal”!),
Nós não ligamos pra nada,
Pensamos que cada um
Voltara a sua morada.
17
Só que no’outro dia nada
De um ou outro aparecer.
E o pior, sempre sumia
Outro sem ninguém saber
Onde que naquela esquina
Ele iria se esconder.
18
Deixei de tanto temer
E passei naquela esquina.
Olhei, cacei, procurei,
“Varri”, “fiz até faxina”,
Mas não resolvi o crime
Daquela “Esquina Assassina”.
19
Então retomei a sina
De andar de madrugada.
E uma noite, por acaso,
Deu-me uma “crise” danada
De bexiga e eu fui mijar
Na’esquina malassombrada.
20
Pois não é que, ao ser mijada,
A danada reagiu.
Abriu-se a boca do chão,
A minha urina sumiu,
Uma coisa me agarrou
E a esquina me engoliu.
21
No que um preso escapuliu,
Ela “correu” pra buscar.
Aí foi mesmo o momento
No qual eu pude escapar.
Vi meus amigos lá dentro,
Mas não queria ficar.
22
Sorte eu poder me livrar
Das garras daquela praga.
Tive que descobrir só
Que quem “lhe” mija ela traga:
Se com quem mija é assim,
Imagina com quem caga!
23
Porém depois dessa saga
Eu respeito toda esquina,
Beco, travessa (´), viela
Seja larga ou seja fina,
Pois pode ser que ela seja
Das que engolem quem urina.
24
Falo ao menino e a menina,
Caso tenham que urinar,
Procurem’um banheiro público,
Mesmo um banheiro de bar,
Mas não urinem na’esquina
Que ela pode não gostar.

RF Amaral

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