segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Clênio: entre o céu e o inferno

Clênio: entre o céu e o inferno
1
Eis a história comum
De um sujeito familiar.
Rotineira em seus detalhes,
Não na forma de contar.
Com suspense em cada passo
E assombro em cada lugar.
2
Clênio, um ser peculiar,
Tinha a sua obrigação
Em assuntos de mercado,
Quanto à árdua criação
De propagandas voltadas
À comercialização.
3
Não via qualquer missão
Dura demais pra “topar”.
Que, apesar do seu serviço
Exigir uma exemplar
Concentração criativa,
Em nada ele achava azar.
4
Pois, tão espetacular
Era a sua condição
De servidor criativo,
Que ele não via razão
Para se desesperar
Diante de qualquer missão.
5
Cumpria a obrigação
Com um esmero sem par
E, na' empresa, todos tinham
Apreço protocolar
A seu trabalho e ao seu modo
De vida tão salutar.
6
Mas o ar sem similar
Da sua história em questão
Haveria de mudar
Diante da situação
De extrema prosperidade
E extrema autopromoção.
7
É que muita afetação
Faz o humano deixar
De usar a mente e viver
Só pra se autoproclamar
Autossuficiente em tudo,
Sem de ninguém precisar.
8
A coisa “pega” a tomar
Gigantesca proporção
E ele finda se esquecendo
De Deus que dá proteção
E seguindo pelos próprios
Desejos do coração.
9
Foi nessa alienação
Que Clênio se viu entrar.
Não só desprezava a Deus,
Como “começou tratar”
Seus colegas com desdém
A fim de os banalizar.
10
Tal postura irregular
Levou-o à extrema ação
De irritar-se sobremodo
Com quem não dava razão
A seus modos cumulados
De soberba e afetação.
11
E, entre uma irritação
E outra, ele “achou de” dar
Força às suas discussões
E terminou por achar
Quem se lhe fizesse achado
Contrário ao seu linguajar.
12
Viu-se nesse popular
Algo a “chamar atenção”:
Sua feição era estranha
À toda aquela extensão
De terra a qual se sabia
Ter aquela região.
13
Parecia que ele não
Era daquele lugar.
Mas, saber de onde ele vinha,
Fácil não era, apesar
De ele, a partir desse imbróglio,
Bastante se apresentar.
14
Clênio até quis evitar
Conversa co' o cidadão.
Isso, porque se encontrou
Cheio de interrogação
Concernente ao forasteiro
Com quem teve altercação.
15
Porém, sua hesitação
Não chegou a alcançar
O seu alvo pretendido,
Que era se distanciar
Do referido sujeito
Que o vinha a ameaçar.
16
“Pegou a” telefonar
Pra o militar batalhão
Que distava poucas quadras
Lá da sua habitação,
Porém nunca conseguia
Completar a ligação.
17
Um dia, em perseguição,
Viu-se envolvido em azar,
Pois o seu carro quebrou
E ele teve que parar
Na “Rua do Entroncamento”,
Um perigoso lugar.
18
Seu desafeto vulgar
Parou sua condução
Também naquele lugar
E deu iniciação
À provocação hostil
Que lhe encheu de apreensão.
19
Vendo aquele cidadão,
Irritado, a provocar,
Clênio pensou em correr,
Mas, não querendo açodar
O' homem com essa atitude,
Decidiu por se acalmar.
20
Xingava ele, sem parar,
Mas Clênio não dava não
Motivo pra irritá-lo,
Inda mais, na' ocasião.
Fazia-se tranqüilizado,
Apesar da situação.
21
Que, não vendo condição
Pra fugir ou retrucar,
Diante do enfurecimento
De homem tão rudimentar,
Decidiu ficar calado
E, aquilo tudo, agüentar.
22
Enquanto estava a pensar
Em qual finalização
Teria aquele conflito,
Eis que o sujeito em questão
Esvoaçou-se no ar
Como ave de arribação.
23
Ficou sem explicação
Ali o Clênio, a olhar
O céu, sem poder mais ver
O ser espetacular
Que havia entrado nas nuvens,
Deixando um rastro ao passar.
24
Correu daquele lugar
Sem fazer perscrutação
Pra ver se o carro do cara
Também voara do chão.
O carro voou depois,
Só que ele não viu mais não.
25
No outro dia, a feição
De Clênio “era” de assustar.
Mas o povo não sabia
O que havia no lugar
Que lhe causasse exaspero
Pra ele assim se encontrar.
26
Quando ele parou num bar,
Logo após ver-se em função,
Trabalhando o dia inteiro
Na sua repartição,
Focou a TV ligada
Em dada programação...
27
Era a segunda edição
De um jornal bem popular
E algo “chamou-lhe atenção”
E ele pediu pra' aumentar
O volume do aparelho
Pra, bem, poder escutar.
28
Estava a noticiar
Uma ocorrência em questão
Na qual um certo indivíduo
Fora(^) encontrado no chão
Da “Rua do Entroncamento”
tima de mutilação:
29
Separada cada mão
Dos braços, noutro lugar;
Uma orelha decepada;
Quebrado o maxilar (c-s);
E o seu pescoço cortado
Mesmo sobre a jugular.
30
Clênio, ao se identificar
Com o lugar em questão,
Pagou o drinque e saiu,
Inda co' o copo na mão.
E, antes de entrar no seu carro,
Entornou toda a porção.
31
Correndo sem direção,
Derrapou frente' a' um hangar
Que ficava em um dos portos
Que havia em dado lugar.
Perdeu do carro o controle
E ele “começou girar”.
32
Com a fumaça a tomar
O largo naquela ação,
Devido ao aquecimento
Do motor, na combustão,
O carro parou de vez
Sem “dar mais na ignição”.
33
Clênio saiu do carrão -
Visto ser esse um Jaguar -
E foi procurar um canto
Onde pudesse encontrar
Ao menos um telefone,
Pois perdera o celular.
34
Entrou num dado lugar,
Sem ver na recepção (p-ç)
Ninguém lá pra atendê-lo,
Mas, tomou a decisão,
Por não haver outro canto
Naquela imediação.
35
Chamou. Bateu no portão
Grande que “devia” dar
Pra os fundos do tal recinto
Onde se achava a gritar...
Porém ninguém atendia
Seu chamado no lugar.
36
Saiu e avistou um bar
Sito* em certa direção
E fez andada pra lá,
Já que a edificação
Parecia estar em festa
Devido à agitação.
*situado
37
Dava pra se ouvir no vão
Da rua o som ecoar.
Havia gente dançando.
De longe, deu pra notar.
E, Clênio, então, apressou-se
Pra logo, logo chegar.
38
No entanto, foi só pisar
Na soleira, na' intenção
De ir falar co' o velhote
Que via estar no balcão,
Cortou-se a música e o povo
Se escafedeu do salão.
39
Essa “desaparição”
Muito conseguiu deixar
Clênio em preocupação
Descomedida e sem par:
Era o fantasma da vida
Vindo o atemorizar!
40
Talvez por sorte ou azar,
Não hesitou na' opção (p-ç),
Que, entre ficar e correr,
Escolheu, sem confusão,
Correr de volta pra o carro
Pifado e sem solução.
41
Não havia salvação
À qual pudesse apelar.
Só correu porque não tinha
Outra coisa pra tentar.
Se tivesse, hesitaria,
Pra o fato solucionar.
42
Porém nem podia dar
Jeito à vil “dissolução”
Do bar e nem, muito menos,
Ao carro na' ocasião.
O jeito era conformar-se
Co' aquela situação.
43
Chegando ao carro em questão,
A polícia militar,
Que já o estava aguardando
Chegar àquele lugar,
Decretou voz de prisão
E ele correu pra' escapar.
44
No entanto, não pôde achar
Qualquer que fosse a ação
Que o livrasse, dado instante,
Da inapelável prisão
Sobre acusação de morte
De um citado cidadão.
45
Disse não conhecer não
Quem lhe vieram citar.
Mesmo assim, não obteve
A soltura, ao se explicar.
Pra o camburão o levaram
E ele, ali, teve que entrar.
46
O delegado, ao olhar
Sério pra sua feição,
Pegou as fotos tiradas
Do corpo do cidadão
Que, provavelmente, fora (^)
Morto a golpes de facão...
47
Clênio até que fez menção
De querer se levantar
Pra olhar aquelas fotos,
Mas não viu necessitar,
Já que o delegado veio
E fez questão de mostrar.
48
Ali, a observar
Aquela mutilação
No corpo do assassinado
Esquartejado no chão,
Reconheceu se tratar
Do homem da discussão.
49
Mas tinha convicção
Que não chegara a matar
Nem em sonhos o indivíduo
Com quem viera a brigar,
Mas só mesmo com palavras,
Sem sequer o ameaçar.
50
Agora estava a pensar
Em toda a situação.
Relembrou aquele fato
Em que ele voou do chão.
Mas já não “tava” entendendo
Nada em dada ocasião.
51
“Como que uma assombração
Poderia se encontrar
Assassinada no chão
Do referido lugar,
Se uma aparição não morre,
Por de uma alma se tratar?”
52
Nada ele pôde ligar
Com nada e nem fez menção.
Ficou calado e adentrou
A cela e, já na prisão,
Não comentou com ninguém
Sobre tal “inconclusão”.
53
Toda aquela indecisão
Iria o atormentar
Muito ainda aqueles dias,
Mas ele não quis falar
Sobre ela de forma alguma,
Pra não mais se complicar.
54
Era a semana a passar
E ninguém vinha à prisão.
Nem mesmo um advogado
Bancado pela nação
Pra defendê-lo daquela
Tão injusta acusação.
55
Lá teve a percepção
Que não se via em lugar
Conhecido dos parentes
Nem dele mesmo e, ao olhar
Pra fora, viu que o local
Não lhe era familiar.
56
Pôs-se a se desesperar.
Viu que tudo era “armação”.
Não havia delegado
E viu que nada era tão
Parecido co' um hospício
Como aquela construção.
57
De fato tinha razão.
Num recinto hospitalar
Era onde fora (^) internado,
Mas co' a mente salutar.
Tudo ali era um complô
E ele tentava escapar.
58
Via-se em outro lugar,
Depois da percepção
De estar em um manicômio,
tima de conspiração...
Agora estava na rua,
Mas não sabia a razão.
59
Logo perdeu a visão
E chegou a desmaiar...
Seu inimigo o buscava,
Talvez quisesse o matar.
Acordou, tava em um quarto
E ouvia alguém conversar.
60
Nisso, diferenciar
O real da ficção
Ficara quase impossível,
Dada a grande confusão.

Era como um pesadelo,
Mas sem finalização.
61
De volta àquela prisão,
Viu ele um familiar
Pagando a sua fiança
Pra que pudesse voltar
Pra casa e poder, enfim,
Aquilo tudo explicar.
62
Já de retorno ao seu lar,
Viu do carro do irmão,
Que pagou sua fiança,
Uma certa aparição
Que muito se assemelhava
Com a da mutilação.
63
Ficou sem explicação
Praquele fato sem par.
Pensou que estava “era” louco,
Devido a não saber dar
Uma descrição precisa
Do que vinha a constatar.
64
Na cama, já no seu lar,
Viu seus pés na' ocasião
Virarem dois jacarés
E engolirem sua mão
Direita e, após, avançarem
Na' esquerda em vil reação.
65
Voltou pra repartição
Onde esteve a trabalhar
Por anos na criação
De propagandas sem par
Que ajudassem o comércio
A cada vez mais lucrar.
66
Não conseguiu mais parar
Para fazer criação
De nova publicidade
Pra comercialização.
Aí, deixou o emprego,
Porque não dava mais não...
67
Foi trabalhar na estação
De trem, a desembarcar
Grandes caixas de produtos
Pra se comercializar
Nas muitas feiras que havia
Na urbe em todo lugar.
68
Depois de não mais se achar
Envolto em dissolução
Mental, ele resolveu
Enfrentar nova missão:
Escalar o Everest
Usando só um blusão.
69
Claro que isso era invenção
Pra o povo se impressionar.
Uma missão suicida
Dessas não “ia” “topar”.
Partiu pra casa dos pais,
Mas decidiu não chegar.
70
De tanto peregrinar,
Cansou numa região
Costeira a Nova Friburgo,
Perto de São Damião,
Frente a Palmira da Flor
E atrás da Serra do Arpão.
71
Brilhava um sol de verão
E ele queria parar
Pra descansar um bocado
Da viagem singular
À qual dera início a pé
Do seu antigo lugar.
72
Só queria repousar
E encontrou uma pensão
Onde pagou por um quarto
E, ao se deitar no colchão,
“Apagou”, dormiu, sonhou,
Sem qualquer assombração.
73
Vendo a normalização
De vida a vir se instaurar
Na sua confusa vida,
Pôde, por fim, sossegar...
Mas indagações ainda
Havia pra' elucidar.
74
Começou a trabalhar
Em tal localização.
A cidade se chamava
“Porto da Aparição”.
Achou estranho esse nome,
Mas não deu muita atenção.
75
Estranho era que a menção
Portuária do lugar
Deveria lhe trazer
Lembranças de algo sem par
Acontecido com ele
Bem antes de ali chegar.
76
E a cidade se tratar
De local de aparição...
Era uma coisa sinistra
Pela total relação
Com o ocorrido com ele
Em passada ocasião.
77
Mas a mentalização
De coisa mais salutar,
Como o bom fato de haver
Lindas moças no lugar
Deixava-o mais desligado
Quanto ao que veio a passar.
78
Começou a namorar
Alguém daquele rincão.
O nome dela era Flávia:
Mulher de bela feição,
Pele morena e sedosa
E um corpo de violão.
79
Também... Com um mulherão
Desses, quem vai se importar
Com circunstâncias quaisquer
Referentes ao lugar?
Tudo é festa, farra e fato
Pra só querer foliar!
80
Estava a oficiar
Numa loja no balcão
Onde recepcionava
O povo. E tinha o talão
Fiscal pra fazer despacho
Das compras com precisão.
81
Esse comércio em questão
Era muito popular,
Sendo a maior livraria
Que ali se podia achar
E a melhor conceituada
Em todo aquele lugar.
82
“Livraria Bulevar”-
Sua designação -
Em preços e promoções,
A melhor da região.
Também, em diversidade,
Era a melhor opção.
83
Porém, quando o Clênio não
Se encontrava a trabalhar
Nessa grande livraria,
Gostava de frenqüentar
Uma lanchonetezinha
Chamada “Bom Paladar”.
84
Ele adorava ficar
Ali de conversação
Co' uns amigos que fizera
Naquela imediação.
De tudo eles conversavam
Na maior descontração.
85
Outra grande distração
Da qual quis participar
Era um “clube de leitura”
Que fez questão de formar
Com alguns interessados
Em ler e, após, comentar.
86
Encontravam-se a falar
Co' extrema dedicação
Sobre um dos belos poemas
De “Allan Poe”. Na' ocasião,
“O Corvo”, o mais conhecido
Desse ilustre cidadão.
87
Ao findar a discussão
Acerca desse exemplar
Poema aterrorizante
De um autor tão singular,
Clênio voltou à pensão,
Que lhe servia de lar.
88
Chegando àquele lugar,
Pegou na recepção
A chave do quarto dele
Co' alguém, ali, de plantão,
E subiu ligeiramente
Pra sua acomodação.
89
Já no quarto da pensão,
Decidiu ir se banhar.
Tirou a roupa e ligou
O chuveiro devagar.
E, passado um certo tempo,
Ouviu um som de assustar.
90
Era como um crocitar
De uma ave sem direção.
Um corvejar, um gralhar,
Um som sem explicação,
Mas um ruído medonho
Naquela edificação.
91
Ligou pra recepção,
Já depois de se enxugar,
Pedindo uma explicação
Para aquele som sem par
Que ecoava na pensão
E o estava a assustar.
92
Ele, então, veio a falar
Que naquela habitação
Não notava nada estranho
A ressoar no salão
Ou em qualquer outro canto
Daquela edificação.
93
“Grilado” co' a informação
Que lhe veio a repassar,
Não viu elucidação
Pra o fato peculiar
Que se dava aquele instante
E “começou estranhar”...
94
O som chegou a cessar,
Mas sem nenhuma razão,
Passados alguns minutos
De uma forte apreensão
Por parte do inquilino
Que a tudo dava atenção.
95
Para Clênio, desde então,
Aquele alívio sem par
Vinha sendo um lenitivo
Que estava a consolidar
Uma quietude total,
Vindo ele a cochilar.
96
Porém veio a se acordar
Co' um som de uma colisão.
Abriu os olhos, mas era
Alguém batendo co' a mão
Na porta. E ele se encontrava
Deitado sobre o colchão.
97
Estando só de calção,
Começou a levantar.
E, após vestir a camisa,
Foi à porta averiguar
Se era o recepcionista
Que ali viera o chamar.
98
Já depois de escancarar
A porta na' ocasião,
Não pôde avistar ninguém
E, então, teve uma impressão
Que tudo ali se tratava
De uma completa ilusão.
99
Mas foi só fazer menção
De a porta querer fechar,
Pra entrar se esvoaçando
Uma ave e o apavorar,
Pois que havia em seu semblante
Algo de familiar.
100
Sensação particular
De horror turvou-lhe a visão.
Já' stava pra desmaiar,
Então ressoou no vão
Do ar domiciliar
Uma voz sem distinção.
101
O animal em questão
Era um corvo e, ao crocitar,
Cantava versos macabros
Que ressoavam no ar
E assombravam mais ainda
Clênio, quase a desmaiar.
102
Vindo um vigor repousar
Sobre a constituição
Total do seu fraco ser,
Trouxe-lhe a disposição
Que faltava pra' enfrentar
Aquela situação.
103
Viu-se com convicção
E uma ousadia sem par.
E resolveu combater
Aquela ave tumular
Que vinha tirar-lhe a paz
Que tanto quis preservar.
104
Estava Clênio a olhar
Pra sua horrenda feição,
Quando ela soltou um grito
Que ecoou na amplidão.
Aí ele, então, conteve
Sua ousada decisão.
105
Delirou. “Perdeu o chão”.
Quase se pôs a chorar.
“O medo foi tão medonho”,
Que não deu pra enfrentar.
Era melhor ser covarde,
Que ficar e “se lascar”.
106
Pediu perdão a falar
Co' uma trêmula fonação.
E a ave, sem se importar
Com qualquer vã contrição,
Soltou outro dos seus gritos
Que abalou até o chão.
107
E, ao vir da recepção,
O vigia pra olhar
O que seria o grasnado
Que o estava a intrigar,
Emudeceu, “no que” viu
O corvo ali a falar.
108
Falava como a cantar
E o versejo da canção
Funérea a qual entoava
Com estranha fonação
Dizia isto que eu, agora,
Registro com precisão:
109
- Sepulcral assolação,
Negra cova tumular,
Feral e atra condição
Funérea e patibular,
Ó levai escuras almas
À cripta sedimentar.
110
- Ó levai, negro luar,
Espíritos em constrição
Para túmulos reservados
Ao negror da escuridão.
Levai, ó terror. Levai-os
Ao lar da putrefação.
111
- Tropel de corcéis em vão
Espaço astral e estelar,
Abismo vil da garganta
Do precipício lunar,
Ó levai ao lar dos mortos
Esse ser corpuscular.
112
- Agouro, auspício e azar,
Chama de irradiação
Escura dos vagos báratros,
Lábio vil da' imprecação
Infernal das asas fúnebres
Do ódio e da solidão,
113
- Ó boca da maldição,
Sangria ventricular,
Peste que habita no grão
Espaço falimentar
Das forças do humano ser
Que vaga no lupanar,
114
- Cessai. Cessai o cantar
Desse ser sem direção.
Mostrai-o os vãos labirintos
De uma alma em vil danação.
E supurai o seu ventre
Co' o ósculo da perdição.
115
Era tanta imprecação,
Que nem deu pra' analisar
Se havia erros de gramática
Ou um desvio similar.
Agora, uma coisa é certa:
Ela sabia rimar.
116
Essa ave, após praguejar
Com tamanha exatidão,
Transformou-se no inimigo
De Clênio na' ocasião
E o tal recepcionista
Não fugiu da confusão.
117
Clênio pegou um arpão
Pra co' o demônio brigar.
E o outro, armado de faca,
Começou digladiar.
Faca vai e faca vem
E o bicho a se desviar.
118
Era o danado a lutar,
Mantendo a conversação...
Respondia. Retrucava.
E, na comunicação,
Nem afracava na luta
Nem perdia a discussão.
119
Clênio viu que a situação
Era boa pra falar
Da sua mutilação
E morte complementar
Na “Rua do Entroncamento”
No seu antigo lugar.
120
- Bem... - Ele “pôs-se” a falar -
Aquela situação
Foi forjada pra você
Sofrer a condenação
E nunca mais conseguir
Se libertar da prisão.
121
- O corpo do cidadão
Ali naquele lugar
Era um pouco parecido
Comigo e eu só fiz “pegar”
E ajeitar alguns detalhes
Pra o tal ficar similar.
122
- Tinha uma câmera a filmar
Nossa movimentação,
Quando o seu carro quebrou
Em tal localização.
Eu só fiz levar a fita
Ao militar batalhão.
123
- Claro que, na' ocasião,
Precisei me transformar
Num outro ser pra que tudo
Pudesse consolidar.
E, assim, acabei “armando”
Tudo sem nem me estressar.
124
Era o fantasma a contar
Toda aquela enganação
E ele e o recepcionista
Na maior confrontação
Contra o bicho que voava
A' uns sete palmos do chão.
125
Luta difícil do Cão!
Ninguém conseguiu ganhar
Só co' a força da munheca,
Mas co' a intervenção sem par
De um certo arcanjo Miguel,
Clênio pôde triunfar.
126
Hoje vive a trabalhar
Na antiga repartição
Onde antes oficiava
No setor de criação
De propagandas voltadas
À comercialização.
 127
Reguardou o coração
Da soberba “insalutar”.
Pediu perdão aos colegas
E decidiu por mudar
Sua vida por inteiro
E nunca mais se orgulhar.
128
Chegando ao sagrado altar
De uma denominação
Protestante, converteu-se
A Jesus de coração
E nunca mais se encontrou
Co' o Mal nem se deparou
Com tanto Cão do inferno.
Só vive pra dar louvor
Ao divino Redentor.
A sua vida é amor
E o seu prazer é eterno.

Autor: RF Amaral


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