segunda-feira, 7 de maio de 2012

Peleja de Emboladores (a poesia do sertão)

Peleja de Emboladores
(a poesia do sertão)

Refrão alheio; quadras abaixo minhas:
Deixa avoar...
O galo canta, o pato avoa.
Deixa avoar...
Deixa o meu carão cantar.
Deixa avoar...
O galo canta, o pato avoa...
Tá no mar, leve a canoa.
Não deixe a barca virar

1
Colega, pra começar,
Quero cantar numa boa
Aqui pra qualquer pessoa
Que quiser nos escutar.
2
Mesmo embaixo de garoa,
De chuva, de tempestade
Decante aquilo que agrade.
Não deixe o povo enjoar.
3
Começo com amizade
A fazer o meu serviço
Porque eu tenho compromisso
Co’o pessoal de agradar.
4
Não cesse o brilho ou o viço,
Que a poesia precisa.
E entre sem ter ojeriza
Da’ebulição desse mar.
5
Todo vate que improvisa
Entra em qualquer oceano
Sem medo e sem desengano
Depois que o mesmo adentrar.
6
Mostre ser pernambucano
De talento e bom de lavra.
No verso, meça a palavra.
Não deixe a rima passar.
7
Meu verso não azinhavra.
Tô preparado pra luta.
Você que mostre conduta,
Que eu garanto não errar.
8
Me preparo pra disputa
Já tando dentro da’arena.
Rimador não me apequena
Na hora de versejar.
9
Desempenho bem a cena,
Que o meu improviso é cru.
Criado no Pajeú,
Não vim aqui “farrapar”.
10
Forte “igual mandacaru”
Eu sou, cantando repente.
Minha comissão de frente
Nunca deixa a desejar.
11
Tá irritado, pois tente
Me derrubar desse palco,
Que eu, no fim, derrubo e calco
A glória do que tentar.
12
Meu repente eu não desfalco.
Nasci pra cantar, colega.
Se adentrar o pega-pega,
Não vai poder me pegar.
13
É melhor levar a jega
Mais equipada pra guerra,
Que a minha rima soterra
Todo que quer me enfrentar.
14
Poeta nenhum me encerra
Em prisão em plena rua.
Já vi que essa rima tua
Não dá pra quem quer cantar.
15
Vim aqui sem falcatrua
Mostrar a minha’arte nobre...
Daí meu povo descobre
Que não dá pra te escutar.
16
Rimo pra rico e pra pobre.
Nunca tive covardia,
Que essa minha cantoria
Me leva a qualquer lugar.
17
Tenha, então, mais ousadia,
Que o teu verso não agrada.
O povo toma a estrada
Porque não quer te escutar.
18
Isso é conversa forjada!
Meu repente é mais zeloso,
Requintado, perigoso
Que o teu em qualquer lugar.
19
Pois queira, com garra e gozo,
Mostrar que canta improviso.
De outra maneira, eu aviso
Que você vai apanhar.
20
És quadrado, chato e liso
Tal qual peça de azulejo.
Procuro, porém não vejo
Você poder me assustar.
21
Sou caboclo sertanejo.
Nasci num chão ressequido.
Enfrento qualquer “moído”.
Nunca fui de amarelar.
22
Saiba que eu sou destemido,
Mais culto, sábio, mais lépido,
Que o meu repente é intrépido,
Impressiona “onde” chegar.
23
Pois o meu inda é mais tépido,
Cálido, formal e garboso...
Se apronte, que eu tô nervoso.
Doido pra te derribar.
24
O meu corpo é mais “caloso”.
Minha rima mais frondosa.
Minha estrofe, portentosa.
Meu improviso, exemplar.
25
Pode vir em verso e prosa,
Canto, ode, fado ou romance,
Que eu aqui não vou dar chance
A quem não souber cantar.
26
Conheço bem meu alcance.
Sei minha capacidade.
Mas desconheço, é verdade,
Quem possa me desbancar.
27
Pra sua “felicidade”,
Hoje você conheceu.
Taí! Mais uma aprendeu
Com quem nasceu pra’ensinar.
28
O povo já percebeu
Que você não canta nada.
Essa conversa fiada,
Isso, não pode mudar.
29
Bem... Siga na mesma estrada.
Entre no mesmo combate,
Que eu garanto que um empate
Aqui não há de se dar.
30
Não divulgue disparate,
Que o povo já se cansou
De ouvir mentira e falou
Que isso não vai agüentar.
31
Se você não dá um show
Nem sabe prender o povo,
Não venha falar de novo
Que eu tô a te atrapalhar.
32
Certo é que eu não me demovo
Da rima que considero
Boa, capaz e prospero
Porque sei improvisar.
33
Ouvir mentira eu não quero,
Que eu não tolero besteira.
Por favor, cante e não queira
Tentar me ludibriar.
34
Sou da gente brasileira
Que sabe e que aprecia
Uma boa cantoria,
Mas, contigo, não vai dar.
35
Sei que a tua poesia
É fraca, estulta e farroupa.
Por isso, vê se me poupa
Desse teu verso escutar.
36
Já tás com fogo na roupa.
E quem ateou fui eu.
Mas inda não aprendeu
Que nunca vai me ganhar.
37
Você que não entendeu.
Precisa de mais cuidado,
Que versejo improvisado
Só faz quem sabe cantar.
38
Você tá desnorteado
Ou então louco de tudo.
Eu tenho bem mais estudo,
Não preciso me humilhar.
39
Tá hora do conteúdo
Ficar ainda mais quente.
Ninguém xinga o meu repente
Pra não vir a apanhar.
40
Seja mais conveniente.
Aceite o que eu lhe aconselho.
Que o meu repente é um relho
Pra o que não quer me escutar.
41
Louco! Vai te olhar no espelho!
Deixa de conversa louca!
E esconde a cara co’a touca
Pra não vir me envergonhar.
42
Mouca audição e voz rouca;
Mente débil, corpo fraco...
Você tá mesmo é um caco.
Não pode me destratar.
43
Vou te jogar num buraco.
Depois cobrir com cimento,
Ladrão, pelintra, nojento,
Não queira vir me irritar.
44
Esse teu conhecimento,
Já sabia que era pouco...
Mas já tá ficando é louco
Querendo me amedrontar.
45
Caduco, besta, tarouco,
Demente, doido varrido,
Deixa de buscar sentido
Pra pensar em me enfrentar!
46
Sei que o pódio é concorrido,
Mas minha voz é fecunda
E a minha mente se inunda
De versos bons pra cantar.
47
Nem foi nem será jucunda
Tua forma de improviso.
Você perdeu o juízo
Em pensar vir me irritar.
48
Só decanto o que é preciso.
Concisa é minha toada.
Se você não ganha em nada,
Não venha me atanazar.
49
Sigo na mesma jornada
Dos grandes emboladores.
E hoje você só tem dores
Por intentar me alcançar.
50
Sou dos vários cantadores
Que zelam a profissão,
Todavia você não,
Que é ruim demais teu cantar.
51
Componho a minha canção
Com zelo e com valentia,
Capacidade, ousadia
E assim vou continuar.
52
Cantando durante o dia,
Eu maravilho as pessoas.
À noite, as rimas são boas.
À tarde, o verso, exemplar.
53
Quem se contenta com broas
Não pode se ressentir,
No entanto, quem quer ouvir
O que é bom, não quer ficar.
54
Você não sabe aferir
O valor de quem é bom.
Só canta longe do tom.
Só o que faz é errar.
55
Deus do Céu me deu o dom.
Não nego aquilo que tenho.
Porém quem não tem empenho
Sempre quer me destratar.
56
Criatividade, engenho,
Ousadia e avidez
Pra cantar é pra quem fez
Esforço e quis estudar.
57
Quem conhece intrepidez
Naquele que traz carisma
Ouve a estrofe e não cisma
Com’o que eu tiver pra mostrar.
58
Olhando por outro prisma,
O que se fala é bobagem.
Ninguém vai achar vantagem
Já antes de avaliar.
59
Não quis falar da imagem.
Eu quis citar o talento.
Quem já ouviu num momento,
Sabe o que tem que esperar.
60
Vamos findar esse intento
De querer provar ao mundo
Nosso talento profundo,
Que eu tento que me ausentar.
61
Já reviramos o fundo
De nossas mentes astutas.
Vamos cessar as disputas,
Que eu também quero parar.
62
Cantamos rimas enxutas.
Não deixamos a peleja.
E o que vier ser que seja!
Que é hora de descansar.
63
Nessa rinha sertaneja
Mostramos nesse momento
Que cada qual tem talento.
Vamos agora parar.
64
Demonstrei conhecimento.
Você demonstrou o seu.
Vamos parar, porque eu
Vou retornar ao meu lar.
65
Foi um grande prazer meu
Cantar com você, colega.
Se já fizemos a’entrega
Do verso, então vou parar.
66
Findou-se esse pega-pega,
Que, afinal, somos irmãos.
Vamos apertar as mãos
E partir pra o nosso lar.
_Autor: RF Amaral_

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