sexta-feira, 11 de maio de 2012

Embola-Cordel III

Embola-Cordel III

Refrão Alheio - abaixo, quadras minhas:

Não corte o pé de juá
Da beirada do riacho.
Meu gado descansa embaixo.
“Todo dia” vai pra lá.

1
Nessa peleja eu me encaixo
Pra vir cantar poesia,
Porque poeta que cria
Não pode se acovardar.
2
Mostrando sabedoria,
Eu me proponho a fazer
Um improviso pra ver
A arte vir aflorar.
3
Canto com todo prazer.
Essa é minha arte completa,
Pois nasci pra ser poeta,
Mensageiro popular.
4
Quero atingir minha meta
Cantando ao som do pandeiro
Pra’alcançar o paradeiro
Onde desejo ficar.
5
Obedecendo o roteiro
Que eu mesmo delineei,
Canto fazendo o que sei
Sem deixar desanimar.
6
Também sigo a mesma lei.
A regra do improviso
Sem advertência, aviso
E alerto, ao cantarolar.
7
A platinela é o guizo
Pra me inspirar no balanço.
Na’inspiração eu descanso
E posso me confortar.
8
Sem reserva, orgulho ou ranço,
Parto com tal maestria
Pra vir mostrar nesse dia
O que eu nasci pra criar.
9
Não vou deixar essa via
Poética na qual caminho,
Pois que não sigo sozinho
Nessa arte tão popular.
10
Sou igual ao passarinho.
A liberdade me guia.
E’a’inspiração propicia
O assunto pra eu cantar.
11
Minha rima evidencia
Que eu nasci para o serviço.
Na tristeza eu dou sumiço
E prossigo a gargalhar.
12
Meu repente é inteiriço.
Minha mente tudo engendra
Tantos quanto’a’escolopendra
De pernas pode contar.
13
Na sacada, quem “se alpendra”
Quer observar a lua.
E, ao me ver cantar na rua,
Desce pra vir me escutar.
14
Rimando sem falcatrua,
Eu levo essa criação
De rimas com perfeição,
Sem jamais titubear.
15
Retiro do coração
Os versos os quais decanto
Sem medo, tremor e espanto,
Porque nasci pra versar.
16
Busco encontrar acalanto
Nos improvisos que faço.
Metro o caminho que traço.
Traço onde vou caminhar.
17
Conquistando o meu espaço,
Me meto nesse fabrico
De versejo e prontifico
A mente a improvisar.
18
Meus repentes qualifico
Como bons e altaneiros,
Completos, retos, inteiros,
De um linguajar exemplar.
19
Eu nunca fui traiçoeiro.
Ajudo todo colega.
Na rima eu faço a entrega
Sem ninguém prejudicar.
20
O vate não escorrega
Na’estrada que eu lhe estendo,
Que o meu trilho é estupendo
E o meu caminho, exemplar.
21
Sem acréscimos, sem adendo,
Sem remendo e sem emenda,
Meu verso segue na senda
Do perfeito linguajar.
22
Também não há reprimenda
Na minha’arte verdadeira,
Que eu canto sem ter besteira
O que o pessoal mandar.
23
Na poesia roceira
E urbana, eu parto cantando
E, simplesmente, mostrando
O que estou pronto a falar.
24
Eu parto também falando
Do que é bom e é ordeiro,
Sem deixar que o meu pandeiro
Venha algum dia parar.
25
Sou do sertão, sou vaqueiro,
Poeta e aboiador,
Conselheiro, professor
E embolador popular.
26
Eu também sou trovador.
Nasci pra esse artefato
Cultural do artesanato
Da arte do embolar.
27
Nunca fui poeta chato
Que faz os outros de bobo.
Retrato a órbita do globo,
Mas, o sertão, sei cantar.
28
Relato o uivo do lobo,
O canto da seriema,
O verde do ecossistema
E o “frutal” que há no pomar.
29
Canto e não vejo problema
Pra seguir nessa jornada
Nos trilhos da embolada,
Que é coisa espetacular.
30
Quem não dá valor a nada
Que o embolador fabrica
Não sabe ou se identifica
Co’a cultura popular.
31
Mas sei que quem qualifica
O poeta embolador
Como vate de valor
Sabe um dom apreciar.
32
O vate, trabalhador
Dos versejos da’embolada,
Tem sua mente formada
No saber que Deus vem dar.
33
A rima confabulada
E arquitetada na’estrofe
É sem empáfia e empofe*,
Prosápia ou coisa vulgar.
*embuste, ardil.
34
É mescla de estrogonofe.
Receita boa e complexa.
Não é coisa desconexa
Que não dá pra’assimilar.
35
Sem deixar idéia implexa,
O poeta faz seu “trampo”,
Mostrando que em todo campo
Ele é capaz de adentrar.
36
Mesmo a luz de um pirilampo
Pode inspirar o poeta
Que no pensamento enceta
O que a boca vai falar.
37
O vate é ser que projeta
No pensamento o versejo
Sem o’intento malfazejo
Que o venha prejudicar.
38
O sertão é seu desejo;
A cidade, o seu recanto;
A academia, canto
Que não “hesita adentrar”.
39
Cantador de coco é tanto
Um rimador como um mestre
Que ensina a todo pedestre
Que pára pra o escutar.
40
Tá de semestre a semestre
Anunciando através
De rimas seus dons fiéis
De saber sem similar.
41
Não traz idéias revéis,
O que é vate verdadeiro,
Mas, o’impostor, que é matreiro,
Só o mal vive a falar.
42
Embolador altaneiro
É aquele que só canta
A poesia que encanta,
Pra chulo não se tornar.
43
Mas há o que se adianta
Mostrando só porcaria.
Porém tudo o que ele cria
É bosta pra se enterrar.
44
Embolador com mania
De palavrão e piada
Perversa, mal engendrada
Não sabe o que é cantar.
45
Prefiro cantar a’estada
Do pássaro nos arvoredos
E desvendar os segredos
Que a noite vem ocultar.
46
Co’o meu ganzá entre os dedos
Polegar e’indicador
Só canto o que tem sabor,
Só provo o bom paladar.
47
Verso sem ter esplendor
Eu não me ponho a dizer.
Baixo calão dá prazer
Só ao que é ruim no cantar.
48
Cantor bom eu quero ver
Cantando as coisas bonitas,
Porque elas são infinitas.
Não é preciso apelar.
49
Mas, com frases esquisitas,
Tem certos emboladores
Que vivem causando dores
No meu “senso auricular”.
50
Esses são os impostores.
Vivem de cantar porqueira.
Dos sábios, não tem quem queira
Parar para os escutar.
51
A cantiga verdadeira
É aquela de linguagem
Boa e que passe a mensagem
Sem palavrões colocar.
52
Tens uns que vêem vantagem
Em cantar merda pro povo,
Corrompendo o velho e o novo
Com termos de lupanar.
53
Esses não têm meu aprovo,
Que eu só aprovo quem leva
A mensagem que eleva
O povo que a escutar.
54
Monturo seco da treva,
Astro sem brilho e sem glória.
Vate ruim não tem vitória
Quando co’o bom se encontrar.
55
Sua fama é ilusória.
Notória é sua fraqueza.
Simplória é sua defesa.
E’escória, o seu linguajar.
56
Já eu penso com certeza
Que poetas dessa laia
Irão deixar nossa praia,
Porque não vão agüentar.
57
Vate que só faz gandaia,
Daqui a pouco vai ser
Renegado do prazer
Do povo lhe admirar.
58
Espero que possam ver
Que a frase má não floresce,
Porque cantador só cresce
Se tiver algo a mostrar.
59
Segrel assim só decresce,
Que nunca teve talento.
Na verdade, o argumento
Que traz, nada vem provar.
60
Por isso vamos, no’intento
De divulgar o que é bom.
Deixemos vate sem dom;
Louvemos vate exemplar.
_Autor: RF Amaral_

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