Embola-Cordel III
Refrão Alheio - abaixo, quadras minhas:
Não corte o
pé de juá
Da beirada
do riacho.
Meu gado
descansa embaixo.
“Todo dia”
vai pra lá.
1
Nessa peleja
eu me encaixo
Pra vir
cantar poesia,
Porque poeta
que cria
Não pode se
acovardar.
2
Mostrando
sabedoria,
Eu me
proponho a fazer
Um improviso
pra ver
A arte vir
aflorar.
3
Canto com
todo prazer.
Essa é minha
arte completa,
Pois nasci
pra ser poeta,
Mensageiro
popular.
4
Quero
atingir minha meta
Cantando ao
som do pandeiro
Pra’alcançar
o paradeiro
Onde desejo
ficar.
5
Obedecendo o
roteiro
Que eu mesmo
delineei,
Canto
fazendo o que sei
Sem deixar
desanimar.
6
Também sigo
a mesma lei.
A regra do
improviso
Sem advertência,
aviso
E alerto, ao
cantarolar.
7
A platinela
é o guizo
Pra me
inspirar no balanço.
Na’inspiração
eu descanso
E posso me
confortar.
8
Sem reserva,
orgulho ou ranço,
Parto com
tal maestria
Pra vir
mostrar nesse dia
O que eu
nasci pra criar.
9
Não vou
deixar essa via
Poética na
qual caminho,
Pois que não
sigo sozinho
Nessa arte
tão popular.
10
Sou igual ao
passarinho.
A liberdade
me guia.
E’a’inspiração
propicia
O assunto
pra eu cantar.
11
Minha rima
evidencia
Que eu nasci
para o serviço.
Na tristeza
eu dou sumiço
E prossigo a
gargalhar.
12
Meu repente
é inteiriço.
Minha mente
tudo engendra
Tantos
quanto’a’escolopendra
De pernas
pode contar.
13
Na sacada,
quem “se alpendra”
Quer
observar a lua.
E, ao me ver
cantar na rua,
Desce pra
vir me escutar.
14
Rimando sem
falcatrua,
Eu levo essa
criação
De rimas com
perfeição,
Sem jamais
titubear.
15
Retiro do
coração
Os versos os
quais decanto
Sem medo,
tremor e espanto,
Porque nasci
pra versar.
16
Busco
encontrar acalanto
Nos
improvisos que faço.
Metro o caminho
que traço.
Traço onde
vou caminhar.
17
Conquistando
o meu espaço,
Me meto
nesse fabrico
De versejo e
prontifico
A mente a
improvisar.
18
Meus
repentes qualifico
Como bons e
altaneiros,
Completos,
retos, inteiros,
De um
linguajar exemplar.
19
Eu nunca fui
traiçoeiro.
Ajudo todo
colega.
Na rima eu
faço a entrega
Sem ninguém
prejudicar.
20
O vate não
escorrega
Na’estrada
que eu lhe estendo,
Que o meu
trilho é estupendo
E o meu
caminho, exemplar.
21
Sem
acréscimos, sem adendo,
Sem remendo
e sem emenda,
Meu verso
segue na senda
Do perfeito
linguajar.
22
Também não
há reprimenda
Na
minha’arte verdadeira,
Que eu canto
sem ter besteira
O que o
pessoal mandar.
23
Na poesia
roceira
E urbana, eu
parto cantando
E,
simplesmente, mostrando
O que estou
pronto a falar.
24
Eu parto
também falando
Do que é bom
e é ordeiro,
Sem deixar
que o meu pandeiro
Venha algum
dia parar.
25
Sou do
sertão, sou vaqueiro,
Poeta e
aboiador,
Conselheiro,
professor
E embolador
popular.
26
Eu também
sou trovador.
Nasci pra
esse artefato
Cultural do
artesanato
Da arte do
embolar.
27
Nunca fui
poeta chato
Que faz os
outros de bobo.
Retrato a
órbita do globo,
Mas, o
sertão, sei cantar.
28
Relato o
uivo do lobo,
O canto da
seriema,
O verde do
ecossistema
E o “frutal”
que há no pomar.
29
Canto e não
vejo problema
Pra seguir
nessa jornada
Nos trilhos
da embolada,
Que é coisa
espetacular.
30
Quem não dá
valor a nada
Que o
embolador fabrica
Não sabe ou
se identifica
Co’a cultura
popular.
31
Mas sei que
quem qualifica
O poeta
embolador
Como vate de
valor
Sabe um dom
apreciar.
32
O vate,
trabalhador
Dos versejos
da’embolada,
Tem sua
mente formada
No saber que
Deus vem dar.
33
A rima
confabulada
E
arquitetada na’estrofe
É sem
empáfia e empofe*,
Prosápia ou
coisa vulgar.
*embuste,
ardil.
34
É mescla de
estrogonofe.
Receita boa
e complexa.
Não é coisa
desconexa
Que não dá
pra’assimilar.
35
Sem deixar
idéia implexa,
O poeta faz
seu “trampo”,
Mostrando
que em todo campo
Ele é capaz
de adentrar.
36
Mesmo a luz
de um pirilampo
Pode
inspirar o poeta
Que no
pensamento enceta
O que a boca
vai falar.
37
O vate é ser
que projeta
No
pensamento o versejo
Sem
o’intento malfazejo
Que o venha
prejudicar.
38
O sertão é
seu desejo;
A cidade, o
seu recanto;
A academia,
canto
Que não
“hesita adentrar”.
39
Cantador de
coco é tanto
Um rimador
como um mestre
Que ensina a
todo pedestre
Que pára pra
o escutar.
40
Tá de
semestre a semestre
Anunciando
através
De rimas
seus dons fiéis
De saber sem
similar.
41
Não traz
idéias revéis,
O que é vate
verdadeiro,
Mas,
o’impostor, que é matreiro,
Só o mal
vive a falar.
42
Embolador
altaneiro
É aquele que
só canta
A poesia que
encanta,
Pra chulo
não se tornar.
43
Mas há o que
se adianta
Mostrando só
porcaria.
Porém tudo o
que ele cria
É bosta pra
se enterrar.
44
Embolador
com mania
De palavrão e
piada
Perversa,
mal engendrada
Não sabe o
que é cantar.
45
Prefiro
cantar a’estada
Do pássaro
nos arvoredos
E desvendar
os segredos
Que a noite
vem ocultar.
46
Co’o meu
ganzá entre os dedos
Polegar
e’indicador
Só canto o
que tem sabor,
Só provo o
bom paladar.
47
Verso sem
ter esplendor
Eu não me
ponho a dizer.
Baixo calão
dá prazer
Só ao que é
ruim no cantar.
48
Cantor bom
eu quero ver
Cantando as
coisas bonitas,
Porque elas
são infinitas.
Não é
preciso apelar.
49
Mas, com
frases esquisitas,
Tem certos
emboladores
Que vivem
causando dores
No meu
“senso auricular”.
50
Esses são os
impostores.
Vivem de
cantar porqueira.
Dos sábios,
não tem quem queira
Parar para
os escutar.
51
A cantiga
verdadeira
É aquela de
linguagem
Boa e que
passe a mensagem
Sem palavrões
colocar.
52
Tens uns que
vêem vantagem
Em cantar
merda pro povo,
Corrompendo
o velho e o novo
Com termos
de lupanar.
53
Esses não
têm meu aprovo,
Que eu só
aprovo quem leva
A mensagem
que eleva
O povo que a
escutar.
54
Monturo seco
da treva,
Astro sem brilho
e sem glória.
Vate ruim
não tem vitória
Quando co’o
bom se encontrar.
55
Sua fama é
ilusória.
Notória é
sua fraqueza.
Simplória é
sua defesa.
E’escória, o
seu linguajar.
56
Já eu penso
com certeza
Que poetas
dessa laia
Irão deixar
nossa praia,
Porque não
vão agüentar.
57
Vate que só
faz gandaia,
Daqui a
pouco vai ser
Renegado do
prazer
Do povo lhe
admirar.
58
Espero que
possam ver
Que a frase
má não floresce,
Porque
cantador só cresce
Se tiver
algo a mostrar.
59
Segrel assim
só decresce,
Que nunca
teve talento.
Na verdade,
o argumento
Que traz,
nada vem provar.
60
Por isso
vamos, no’intento
De divulgar
o que é bom.
Deixemos
vate sem dom;
Louvemos
vate exemplar.
_Autor: RF Amaral_