segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

7 Sonetos Letais - Poeta Felipe Amaral

7 Sonetos Letais
Felipe Amaral
1
Treda casa do medo onde reside
O negror cadavérico da cova,
O fantasma da noite que renova
O terror que ao denodo traz revide.
O mortífero caos que reincide
Contra a ordem quieta que desova
No remanso o conforto que reprova
O furor comensal que a alma agride.
Porta aberta ao mortal desconhecido.
Sensação contumaz que há desferido
Na coragem o golpe mais cruel.
Já resfólega o ser no último arquejo.
Eis a tumba onde jaz. Vede o cortejo
Dos lesmáticos vermes em tropel...
2
A caveira risonha se aproxima
Não trazendo em seu riso o reconforto,
Mas a negra caudal de um rio morto
Que no lodo adormece e desanima.
Não há fluxo venoso que reimprima
Nas artérias do ser, já absorto,
Reavivos de paz. Não há um porto
De seguro vigor que a dor dirima.
Desfalecem os sonhos mais vitais.
Deperecem os planos e os sinais
De esperança fenecem frente a chaga.
O silêncio o cultua, o luto o vela;
O caixão o deseja, a cova o anela;
O cortejo o lastima; e a história o apaga.
3
Tumulares futuros nos esperam.
O “nascer” e o “se pôr” são duas faces
Dessa nossa existência onde os impasses
Mais atrozes nos tragam e encarceram.
Vede as flores que murcham quando alteram
Seu vigor se entregando aos desenlaces
Que o carpir tanto aclama em seus repasses
De tristezas que não se degeneram.
O “rubor” se desfaz “crepusculando”
O viver que sucumbe, abandonando
A existência terrena na partida.
O letífero golpe leva ao chão
A sequóia dos sonhos e, no vão
Sepulcral, jaz a vida falecida.
4
Eis o esquife levado pelas mãos
Dos que, em fúnebre marcha, vão carpindo.
Eis a dor que no peito faz bem-vindo
O deploro de crentes e pagãos.
O painel da tristeza toma os vãos
Que os sorrisos deixaram, num infindo
De lamúria que mata o sonho, rindo
Dos anseios de jovens e anciãos.
O martelo batido, não há nada
A fazer. A contagem foi chegada.
É a hora de ir sem questionar.
Um abutre, mais perto, sobrevoa
Vendo um corvo inquieto que entoa
A canção do cruor patibular.
5
Cruzes brancas aos montes lá estão.
A necrópole sorve a energia
Dos que vêm sepultar a alegria
Juntamente co'o morto no caixão.
Os sepulcros caiados da visão
Dão requinte a essa atra cercania.
Porém dentro dos tais a terra fria
Guarda pútridos féretros no chão.
O ataúde que desce leva ao pó
O cadáver que jaz no mesmo só
Com a roupa do corpo que apodrece.
Na jornada, talvez a alma siga
E, encontrando outra alma, ao pó bendiga,
Mas, se não, irá só sem riso e prece.
6
Viam ter no Além um guardião.
Hoje nada restou que o mesmo guarde.
Talvez seja só pó e o “fim de tarde”
Represente o desfecho da missão.
Mas a alma padece em propensão
De insistir em querer ser “sol que arde”
Num eterno de paz sem ver alarde
No partir desta terra de ilusão.
Talvez nossos espíritos tão fracos
Achem brechas nos vãos que há nos buracos
Pra os quais mandam os corpos já de ida...
E, escapando do solo, fitem céus
Onde habitem distante de escarcéus
Que na terra sufocam nossa vida.
7
O teor cabalístico da morte
Aparenta-nos ser nau de mistério,
Que há nas covas sem fim do cemitério
Uma espécie de lúgubre transporte...
Que nos leva aos recônditos do forte
Onde vivem os mortos num etéreo
Benfazejo prazer supra-sidéreo
Que, diante do fim, seja um suporte.
Eu, que creio, não vejo na matéria
Esperança que, contra a deletéria
Morte atroz, reavive o ser que jaz...
Já que é cego este pó que me encarcera,
Preferi postular “uma outra” “esfera”
Na qual possa, algum dia, encontrar paz.

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