sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Lírica

Lírica
1
Veja o céu como enfatiza
O arrebol que ruboriza
A face do infinito.
O sol que morre se vai
E o negror se sobressai,
Deixando o “astro-rei” proscrito*
*degredado
2
Começa então a ser rito
Os sopros que dão ao mito
Da noite um tom de leveza.
Mas que carrega guardado
Dentro um aspecto assustado,
Embora de astral beleza.
3
A eterna chama acesa
Da' infinita sutileza
Da noite à brisa se afaz.
Tudo fica mais solene
Pra que a poesia se engrene
Aos ambientes da paz.
4
O boêmio satisfaz
Seu coração e se apraz
Co' a essência que permeia
As ruas e o faz poeta
Decantando a mais completa
Canção da paixão alheia.
5
Um tom escuro sombreia
Becos, por onde vagueia
Um casal enamorado.
A lua brilha e o vento
Preenche de sentimento
O caminho a ser trilhado.
6
Há todo um prazer guardado
No cenário abobadado
De um céu de noite boêmia.
E, entre tudo o que se passa,
Não há gente que se faça
Desse prazer abstêmia.
7
A noite é parente fêmea
Do dia e uma irmã gêmea
Das muitas que surgem nuas,
Erotizando as vielas
E tornando bem mais belas
As silhuetas das ruas.
8
Vê-se nas calçadas duas
Almas e, as palavras suas,
“Se misturam” co'o cenário
De essencial poesia
Que desejo a tudo envia
E o que mais lhe é necessário.
9
Vitrines luzem no horário
Que o noturno campanário,
Através de muitos sinos,
Avisa que tem seu posto
Garantido em seu proposto
Negrume de trajes finos.
10
Anoitecendo, os meninos
E as moças, sem desatinos
Permitem-se conhecer
Tanto mais sensivelmente
Quanto mais intimamente,
Por ansiarem o prazer.
11
É no frio anoitecer
Que as ruas levam o ser
A querer-se apresentar
Como disposto a sorrir
E caminhar sem sentir
Que a noite possa acabar.
12
Há encanto no luar
E acalanto em cada olhar
De jovem querendo expor
Seus sentimentos ocultos,
Embora “cheio” de adultos
Pra “lhe explicarem” o amor.
13
Tudo se enche de um sabor
“Bom-vivã”, onde o teor
De algo na vida se faz
Mais saliente, à medida
Que o que mais cresce na vida
É' o que mais nos satisfaz.
14
O horizonte por traz
Da escuridão perfaz
Percursos em meio ao halo
De mistério que circunda
O Vão da noite e inunda
O mesmo, a fim de abarcá-lo.
15
Há um espectro vassalo
Que serve como de embalo
E incentivo aos poetas
Que são como suseranos
Delineando os seus planos
Na tela viva das metas.
16
Existem cenas discretas
E outras de escândalo repletas
Pairando na amplidão
Do vão da noite em surdina
Vaga, urbana, citadina
E serva da multidão.
17
Roja-se audaz pelo chão
A serpente da' incursão
Da volúpia esquiva e ardente.
Quem tenta se ver distante
Vê como é forte e pulsante
Seu veneno impenitente.
18
Surgem desvarios da mente
Quando o noturno ambiente
Carrega-se de imperícia.
O corpo arqueja ante o assédio
Por não encontrar remédio
Pra tamanha impudicícia.
19
Prazeres vãos, em milícia,
Vêm ao corpo que, a delícia
Sensual de tudo prova.
O ser é refém do medo,
Porém não guarda em segredo
O impudor que em si reprova.
20
Uns indivíduos à cova
Vão em noite que desova
Na' areia do mar da vida
Sedições incomplacentes
Que levam seres viventes
Ao desfavor que os liquida.
21
A boca da noite olvida
Os assobios de homicida
Melodia que perpetra.
bados caem nas calçadas
E as madrugadas geladas
Resfriam quem as penetra.
22
Morfeu em trevas soletra
Sonhos os quais cronometra
Co' as ampulhetas da noite.
O abismo acorre à negrura
Pra repousar na candura
Dos ventos que dão de açoite.
23
Pra que o mistério se amoite
Na' escuridão e se acoite
No coração dos abismos
A noite oferta prodígios
Aos céus que alentam* vestígios
De espanto em seus cataclismos.
*acolhem
24
Arcanos e exotismos
Em meio aos esoterismos
Diversos que a treva abriga.
Tudo dá à noite linda
Uma aura de paz infinda
Que seda (´) o ser que a' investiga
25
A madrugada fustiga
O ser co' o frio que castiga
O corpo e regela a alma.
O firmamento, inda escuro,
Põe em seu seio o obscuro
Forro espectral sem ver trauma.
26
À noite reina uma calma
Tão transcendental que espalma
O alvo céu e aplaina a bruma...
Dos ares me vejo mais
Perto em momento em que os ais
Vão-se em sopros como a pluma.
27
Assim a noite costuma
Fazer quando “se averruma”*
Nas experiências minhas.
De todo me surpreende,
Estimula, inspira e prende
Nas parras das suas vinhas.
*penetra como broca
28
Lá pelas casas vizinhas
Cagam lembranças sozinhas
Em busca de alguém que as busque.
Pois que há nas recordações
Risos, os quais são razões
Pra que ninguém as ofusque.
29
Embora muito corusque
A lua, pra que rebusque
A noite de oníricos brilhos,
O negror é mais intenso
E tem por corpo o imenso
Cosmos de astros andarilhos.
30
Porém não há empecilhos
Para os muitos estribilhos
De canções da boemia.
Soam, alentam, animam
E, sublimes, aproximam
Os seres da poesia.
31
É visto que a rua envia
Inspiração que irradia
No vasto espaço estelar
Quando a luz do dia morre
E se embriaga co' o porre
Que a noite vem lhe ofertar.
32
Ao ver o claro lunar
Começo a estimular
O coração a sentir
Seu toque frio e obscuro,
Mas que contém o mais puro
Estro que possa existir.
33
Visto-me, então, pra sair,
Pois quero me divertir
E aproveitar o lazer
Que os ares noturnos põem
À mão dos que se dispõem
A festejar o viver.
34
Porém, o amanhecer,
Chegando, chega a fazer
Meu ser menos motivado.
ssaros chilreiam no turno
Que se apresenta diurno...
Quero o noturno e me enfurno
Pra, à noite, estar acordado.

Autor: Poeta Felipe Amaral

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